caminhando semidesperto ao longo do oceano cinzento

As lembranças se esvaiam junto com a intoxicante sensação de mal estar que ele carregava. Ali, andando na vazia faixa de areia enquanto as nuvens invadiam com intensidade o céu que agora há pouco estava próximo do azul anil. O mar se estendia para a imensidão do Oceano Atlântico, interrompido por uma indefesa ilha - a qual ele contornava com sua típica força e intensidade. Os detalhes estavam mais vivos, junto com as cores e as mudanças. O ponto de transição se aproximava de seu ápice e a instabilidade eram coisas relacionáveis e reais, e ele se sentia feliz e livre outra vez. Mesmo que não vendo uma resolução simples ou concreta para aquilo, estava se sentindo bem. Aquilo que faltava parecia estar chegando com uma magnitude que nunca havia observado antes. Todos os relacionamentos anteriores pareciam superficiais e ele agora se perguntava como conseguia acordar ao lado de pessoas por quem ele não sentia nada especial. A idéia agora causava repulsa, mas nada o estava atingindo - apenas a maresia, de um modo diferente e positivo. Sentia o vento baixando a temperatura em ascenção nesse fim de novembro, mês esse que anuncia, todos os anos, o verão mordaz e [sempre] surpreendente. O poder de algo real se alojou nele. E ele não queria que nunca mais o abandonasse.

Citação: E.M. Forster - Maurice (livro)

acidez platônica

Que coisa toda é essa? Que sensação insuportável, inodora e imaleável. A parte boa do sentimento se anula com a falta de perspectiva do mesmo, e a parte ruim é atenuada com o fim do semestre e o acúmulo de provas, trabalhos e irritações que ele trás junto. Tudo piora quando suas principais amizades se diluem (em falta de convivência ou em excesso da mesma) e seu potencial social cai por terra. Como um inescapável efeito dominó, tudo começa a parecer chato e tedioso, as paisagens vão corando no monocromático e seu pricipal alento passa a ser a bolha que envolve sua personalidade agora instável. Seu quarto vira prisão de solidão, seus hábitos se voltam para se afundar em ninguém além de si mesmo, e seu espírito antes marcante e idealista se ressalva na cansativa e repetitiva escrita da depressão. Você fica se perguntando como se enfiou em todo esse drama inventado e, mesmo ao perceber o caráter não intencional da situação, você se auto mutila com culpa e arrependimento. Deixa estresse e vícios tomarem conta e o fardo de se mover é inerente - regredir parece mais fácil. Está insuportável e se deixa minar por negativismo, mesmo que, por dentro, tenha aproveitado o pouco que seja da intensidade dessa porra indefinível. Todos parecem progredir em suas vidas pessoais e você parece estar parado, sem ter para onde correr, ou se esconder. Parou.
É, você precisa de alguém ao seu lado.
Alguém que goste de você, de quem você goste.
Alguém para dividir sentimentos mútuos.
Quer esse sentimento real e intenso se aplicando em um relacionamento também real.
Quando será que esse tal alguém vai me encontrar, me atingir?
Olho para o abismo do mar e não consigo achar resposta que me satisfaça...
...ou algo que me dê segurança.
Parece que estou imerso no meio de uma gigantesca mudança, só não acho nenhuma resolução para ela.

entre eu e você, 1

Começo de tarde. Sol alto, calor ao ponto do insuportável, praia chamando por meio de sua irresistível brisa marítma - e pelo cheiro inconfundível de protetor solar. Você me chama para um banho de mar enquanto coloca seu biquini azul com bolinhas brancas que contrastam perfeitamente com seus olhos azuis e sua pele em transição para algo próximo do bronzeado. Corremos em direção ao mar enquanto as ondas nos pegam sem nenhuma surpresa, com exceção do choque térmico que envolve nossos corpos e a sensação sempre garantida de alívio e ao mesmo tempo intensa que a água salgada trás. O vento parece não incomodar porque nada mais parece incomodar, afinal, está só nós dois e tudo parece conspirar para uma ótima tarde. E realmente foi, como sempre acaba sendo ao seu lado.
E aí que vem na memória todas aquelas noites em companhia sua, nesses últimos três anos.
Minhas estações começaram a ser marcadas não só pelo clima, mas por alguém.
Todas os abusos no álcool com você, todos os filmes idiotas e caricatos, todas as listas e todos os cafés - ah, e nossos pequenos rituais.

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Finalmente pude matar minhas saudades suas hoje. Sério, mesmo com nosso (pequeno, porém, ao menos para mim, risivelmente perceptível) afastamento, você continua sendo a que melhor me entende, e continuo te entendendo do começo ao fim. Continuamos com nossos modos diferentes e mudamos muito - na verdade, o que é mais latente é que mudamos de cenário, e, agora, estamos os dois em panos de fundo diferentes - mas nossa relação pareceu intocável e acho que a noção de nós dois juntos nunca vamos perder. Queria acordar amanhã ao seu lado, mas a rotina impediu esse desejo e a trilha inventada de hoje pôde reparar um pouco a falta que você me fez. E, só porque você manteve seu espírito nesses quase três anos que nós temos juntos, loira... te amo.

entre eu e você(s)

A noite se aproxima enquanto os quatro se aconchegam em uma praça do centro da cidade, com uma decente vista para a baía. O céu se apresenta, como de costume nessa época do ano, instável, e a presença de chuva irá se tornar realidade em alguns minutos. E a noite não é só o que se aproxima: as resoluções de fim de ano também, assim como os quatro, que estão mantendo por algumas horas uma conversa animada e fluente que eles não tinham por algum tempo. É estranho que, mesmo cada um deles estando em momentos e situações diferentes, e mesmo com uma convivência diária forçada pela escola de quase dois anos, eles se entendam, se conheçam, e, mais elementarmente, se identifiquem tão bem. A noite vai caindo e a garrafa de vinho se esvaindo, enquanto palavras soltas eram trocadas.
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Talvez a superficialidade tenha mitigado a percepção de valor dos outros para algumas pessoas, mas é certo que sem relações humanas não há felicidade verdadeira. E na base das relações humanas está a amizade, cuja construção irá influir em toda e qualquer possibilidade de aprimoramento de relacionamentos. Me afasto rápido dos outros apesar de ter facilidade para me enturmar - enturmar, não aproximar. Meu maior conforto agora se volta para meus amigos, os verdadeiros, que realmente se preocupam e que, querendo ou não, realmente te conhecem. Pode parecer tudo meio permeado de clichê e falso sentimentalismo, como se fossem frases saídas de algum filme adolescente dos anos 80, mas ainda assim confio no poder de um abraço quando não sei como resolver as coisas, quando não sei nem por onde começar.
O que quer que escreva, sei que [meus] amigos verdadeiros sabem o significado que quero pesar por aqui. Chego a me irritar as vezes pelo nível de conhecimento que algumas pessoas adquiriram de mim, e é inevitável que as discrepâncias de personalidade levem ao aborrecimento, mas ainda assim... não há comparação ao lado positivo. É nessas horas que me pergunto como posso me sentir terrivelmente sozinho às vezes, e vejo que é pura bobagem, que não tem muito fundamento, mas uma verdade meio assustadora por trás. Que seja.

love you guys.

keep your love locked down, you lose

A promiscuidade não funcionou bem para mim - quem sabe por falta de ceticismo e sordidez. Quer dizer, por um tempo até que funcionou, mas isso não significa que funcionou bem, de qualquer forma. Depois de tanto tempo ignorando sentimentos me sinto com pouca vontade e extremamente irritado. Quero sair disso e mudar de cenário, algo não possível nesse momento. Mas não adianta se estender nas linhas de depressão, que já não representam nem mais uma terapia... e sim pura e simples auto-mutilação - e não vale mais a pena. Prefiro refletir sobre o que posso melhorar e fazer corretamente daqui para frente do que remoer o passado, mas não é como se eu estivesse escolhendo. E eu queria ter escolhas verossímeis.

I'm in love with you, but the vibe is wrong
and that haunted me, all the way home
(...) see I wanna move, but can't escape from you
so I keep it low, keep a secret code...
so everybody else don't have to know.

keep your love locked down, your love locked down
keepin' your love locked down, your love locked down
now keep your love locked down... you lose, you lose.

Kanye West - Love Lockdown

enjoy the silence

sentimentos são intensos; palavras são triviais
elas são sem sentido e esquecíveis

O som do mar agitado lutando contra imóveis pedras; o som de árvores cuja mobilidade se perpetua pelo insistente vento; o som de um bando de pássaros inundando o instável céu de novembro. Em contraponto ao som que palavras fazem, esses ruídos parecem infinitamente mais bonitos e, na verdade, sem a menor controvérsia, realmente são.
Algumas vezes palavras são temivelmente necessárias, mas, em boa parte do tal "tempo", elas são perfeitamente dispensáveis. As vezes elas servem com o único propósito de machucar, e, quando são ditas sem qualquer propósito, elas invariavelmente machucam - ou ao menos irritam. O problema é que elas escondem o tão proveitoso silêncio, avançando com um superficial andar sobre ele. Não que o silêncio, em seu mais puro significado, seja possível sem aparatos modernos, mas quando nos silenciamos por certo tempo percebemos melhor a elementariedade e o valor do que nos rodeia. Conseguimos refletir com melhor sonoridade e acabamos que por refinando nosso vocabulário, fazendo melhor escolha de palavras ao falar. Em nossas relações pessoais, o uso abusivo de palavras acaba que por desgastando o sentido de estar ao lado de outra pessoa. Acaba destruindo o prazer de sentar na beira do mar ou no topo de uma montanha ao lado de alguém e experimentar a mistura de frio e rugido que o vento traz e o alento proporcionado pela outra pessoa. Acaba que deturpando o sentimento, por que palavras simplesmente complicam as coisas.
Não é tão difícil achar verdade naquele velho ditado; "uma ação vale mais que mil palavras". Elas podem soar bonito de tempo em tempo, mas moderação é prescrita.

Citações: Depeche Mode - Enjoy the Silence
(aliás, a idéia do texto veio da música)

life is a dream

you say life is a dream where we can't say what we mean
maybe just some roadside scene that we're driving past
there's no telling where we'll be in a day or in a week
and there's no promises of peace or of happiness
well is this why you cling to every little thing
and polverize and derrange all your senses

maybe life is a song but you're scared to sing along
until the very ending
it's time to let go of everything we used to know
ideas that strengthen who we've been
it's time to cut ties that won't ever free our minds
from the chains and shackles that they're in

we built our houses of cards
and then we waited for it to fall
always forget how strange it is just to be alive at all...

Patrick Park - Life is a song

as ondas

Não importa o quão mal estou, há coisas que sempre irão me ajudar. Ao observar as ondas quebrando na areia ou os movimentos que a árvore faz ao acompanhar o vento, em cima de uma bicicleta, vejo o quão superficial são minhas preocupações em relação ao mundo. Em relação ao quanto ainda tenho que ver e vivenciar. A grande gama de coisas que o mundo podem me oferecer depende de o quão disposto estou para abandonar o medo e prosseguir. O número de pessoas que ainda tenho de conhecer e o número de amizades que tenho para prolongar. Não é preciso tanto drama, até porque em parte ele nem é verdadeiro. Fui iludido pelas minhas próprias falsas expectativas mas prefiro me sentir mal a não sentir nada, talvez.
O que se passou se passou e agora é importante seguir em frente, sem deixar o passado me bifurcar para um buraco de isolamento. Haverá sempre o amanhã, haverá sempre o sol nascendo e as nuvens que o cobrem eventualmente o deixam brilhar e fogem de sua força. Quero que esse espírito renovador tome conta de mim de novo e espante o que quer de ruim que esteja sentindo agora... até porque sei que, em algum momento, irá espantar, como já o fizera antes.

how long can you miss someone?

Me pergunto até quando isso durará. Criei um compromisso de não ficar mal por qualquer coisa que fosse acontecer em relação ao sentimento que criei, mas o compromisso se mostrou falso ao não conseguir mantê-lo. Agora estou irritado com minha rotina e com minhas atitudes em relação à outras pessoas, e não vejo meios viáveis de consertar relações que mantive tão bem por certo tempo. Me sinto perdido e sem nada em que me apoiar, já que minhas amizades mais fortes foram enfraquecidas. Queria poder parar elas em certos momentos para que elas continuassem tão fortes e próximas como eram, mas é um pedido impossível e até meio hipócrita de se fazer, porque eu fui um dos motivos centrais que as enfraqueceram.
Quero coisas novas mas ao mesmo tempo não quero me desligar do que me fez tão bem. Estou em terreno instável que eu mesmo desnivelei. É incrível como demoro para me aproximar de alguém e como sou rápido em me afastar. Não quero mais tanto peso em minhas costas, mesmo sabendo que toda a culpa não é minha...

Citação: Blood Red Shoes - Say Something, Say Anything

dogma do mesmo/oposto

Acho um tremendo desperdício quando as pessoas se auto limitam. Quando criam uma idéia pré-concebida tão forte sobre algo que não as deixa experimentar, as vezes, essa idéia nem as deixa pensar e refletir sobre algo que não esteja ao seu imediato alcance ou entendimento. O quebra-cabeça que perdura na mente acaba sendo esquecido com a justificação do desconhecimento, ou seja, a ignorância induzida. E isso se estende à todos; criamos em diversas ocasiões essas opiniões não mutáveis sobre algo, independente do nosso nível de intelectualidade ou qualquer outra coisa. Alguns, claro, criam mais pré-concepções do que outros. Temos medo do que nos é desconhecido, e o que nos é desconhecido pode levar ao preconceito. E preconceito é medo do desconhecido, simple as that.
A sexualidade humana é um desses quebra-cabeças que perdura pela nossa existência. Alguns deixam sua sexualidade ser oprimida pelo convencional e prático, que já estava predestinado para acontecer - casar-se com alguém do sexo oposto, tendo três parceiros sexuais (também do sexo oposto) no máximo ao longo da vida, deixar esse legado conservador para os filhos. Alguns acabam se identificando como homossexuais, firmando relações com pessoas do mesmo sexo e exclusivamente do mesmo sexo, alguns chegam até a levantar bandeiras de orgulho, exclamando pela rua sua orientação sexual, o que não há nenhum problema. Mas, de novo, leva a limitação. Não acredito em exclusividade; acho que a sexualidade e a atração em si - não só sexual - está envolta em um dogma que está se convertendo do relacionamento homem-mulher para o homem-mulher mais casais do mesmo sexo. E ponto final. Ou seja; ou você é heterossexual, ou você é homossexual. E alguns incorporam esses rótulos com efêmera excitação. É um inexorável fato que você, se identificando (ou não) como hetero ou homo, irá sentir atração pelos dois sexos. Porque não é uma questão de ser homem ou mulher. É uma questão de sentir atração. É absolutamente real também que existem tendências e tal indivíduo pode se sentir mais atraído por tal sexo, mas, não se deixe cair na armadilha do rótulo. E esses rótulos não vem apenas da nossa cultura consumista, e sim de todo um desejo humano de se sentir parte de algo; traz satisfação dizer que se é algo, de facto, quando ser esse "algo" traz toda uma implicação social.
Acredito que a tendência à se sentir atraído por um sexo é uma característica pessoal, não o resultado do ambiente em que a pessoa viveu ou qualquer outra bobagem do gênero. É como ter olhos castanhos ou azuis; você os tem e pronto. É claro que ao longo dos anos eles podem mudar um pouco de tonalidade, mas totalmente eles nunca irão se alterar.

aquele velho sentido

Não havia como ter garantias, pensou ele, ao atravessar quase intransponíveis poças naquela movimentada rua, em um fim de tarde chuvoso de sexta. Estava repensando a inexorável e inevitável mudança pela qual passara nos últimos meses, respaldada de incertezas e experimentações. Agora se perdia na dúvida da maturidade, se perguntando se então era verdade quando os escritores franceses proclamavam que as cores iam perdendo seu gradiente com o progresso da idade. Se sentia pesado e que havia cometido erros, mas ainda assim não tinha arrependimentos. Entrou em uma cafeteria também para fugir da chuva, porém mais para pegar um café expresso forte e um maço de cigarros, abandonando o abandono à nicotina. Queria ficar sozinho mas precisava de alguém ao seu lado, e quem estava ao seu lado já não lhe trazia aquele velho sentido que tanto procuramos para continuar com um sorriso estampado no rosto. Ele não estava procurando uma determinante pessimista, porém era só em que seus pensamentos resultavam. Precisava de um tempo, de um novo cenário, de frio, de outros caminhos. Estava tudo meio limitado mesmo com os múltiplos caminhos que sua vida pessoal - razão principal de sua angústia atual - poderia tomar dali pra frente. A segurança se fora, e agora procurava, no fundo de um copo de café, alguma resposta, enquanto dois senhores ao seu lado discutiam política com fervorosas e contrastantes opiniões - fervor, contraste, extremismo; uma forte correnteza que o guiasse era o que ele precisava... e enquanto aquela chuva amainava e o incerto tempo ia se abrindo, percebeu que o que precisava era realmente se deixar levar, sem cair em demasiada preocupação sobre coisas na qual ele não possuía exato controle. Já a garantia... bom, do que adianta ter uma garantia quando ela invariavelmente acompanha estagnação? Enquanto se perdia em suas usuais e atualmente intensas demais (intensas ao ponto do isolamento) reflexões, as pessoas iam passando, cada uma delas progredindo em sua história. O forte café já tinha acabado e o segundo cigarro também, agora caído no chão e se apagando aos poucos com cada pingo de chuva que ia mitigando sua brasa.

quem fodeu?

who fucked up what we had?
and what we had was so nicely wrapped up
wrapped up in stuff only we could understand
and who would imagine
that it would end up so abruptly like this
don't blame the other guy
because there's only two persons to blame
or maybe just me...
but anyhow... keep in mind that you're still my surfin' bird.
I used to love what you did to my lips,
every time we saw each other
what you became so used to do
and what I became so used to receive from you
what you did to my bones,
what you did to my humor...
be sure... I'll always remember a moment with you,
in the middle of a lot of great ones,
and instantly my mouth will dwell on a smile

I want to talk to you about everything again
I want to share more wine and more nights
and more mornings on the bed
but... I just can't anymore.
and, as it seems now, neither can you.

(eu fiz esse despreocupado e largado post
como um tributo ao que tivemos,
que também era desse modo)

in love with a feeling

Se foram as semanas, se foram as idas até o terminal, se foram as tardes cheias de expectativas - e a expectativa no geral se foi junto. Mas o encanto ficou; na verdade, ele parece estar em um ascenção desde que ele invadiu. A instabilidade que resultou em intensa bipolaridade parece estar indo embora, mesmo que aos poucos. Algumas coisas ficaram mais claras mas ainda estou muito confuso e perdido, ainda que as paranóias se amainaram. Concordo que estou apaixonado por alguém, mas talvez esteja ainda mais apaixonado pela sensação de estar apaixonado - sensação de querer, de ansiar, de sentir ciúmes, de ficar bobo. Ameaça meu egocentrismo o que vou escrever, mas preciso de alguém ao meu lado. Ao meu lado para confessar, para rir, para dormir junto, para cair no mar, e até para eventualmente brigar. O que eu tinha que, pensando bem, era um pouco próximo disso, acabou por diversas razões, razões essas que nem decifrei por completo ainda, ou analisei direito a culpa.
Vejo agora o quão absurdo - e até, por um lado, imaturo - foi construir todos meus relacionamentos com o expoente da casualidade, o que sempre os minou de limitações. Não sei quase nada de namoros, o que sei são ínfimos detalhes, e o maior relacionamento que posso decididamente chamar de namoro durou menos que três meses (ótimos meses, diga-se de passagem) - e, é, relacionamentos fixos são anos luz diferentes de um namoro. Vendo pelo lado positivo, porém, foi legal conhecer tanta gente nova, descobrindo tantas coisas novas e curtindo tanto; de certa forma entendi o que precisava para minha idade, e o que precisava não era algo sério que não fosse conseguir corresponder ou me manter por falta de maturidade ou mesmo por não ser o momento certo. Mas me pergunto quando finalmente vou conseguir engatar algo com alguém (não que eu acredite naquelas comédias românticas absurdas com um "lindo" final). Pode ser meio cedo para eu me fazer essa pergunta, mas me sinto, em um estado prolongado, bastante carente, já não convivendo tão bem com minha induzida solidão. Essa situação me fez ver diversos outros panoramas que nunca tinha ou me interessado ou sequer sabia da existência, o que é bastante benéfico.
Queria conseguir pronunciar, em alto e bom som, que estou apaixonado e por quem estou. Porém é intrínseco da minha vulnerabilidade não deixar - mas o extremismo as vezes é tão delicioso...
Espero que tudo volte à como era antes e que a amizade se preserve, como parece que vai acontecer, é só uma questão de tempo. E é só porque estar com você é tão bom para mim, meu humor muda com uma austeridade incrível. Não estou esperando por você, mas caso você queira vir... pois é.

Citação: Babyshambles - In love with a feeling

fuga

Ele continuou correndo. Correndo pelas sujas ruas do centro, enquanto as dúbias luzes da cidade iam o chocando contra insolvíveis dúvidas. Estava tudo meio nebuloso e tudo parecia meio pesado demais para ele aguentar. O aroma típico de fumaça fazia ele entrar em um estado nostálgico e depressivo, e as cores estavam limitadas ao monocromático tom do preto de branco. O caminho já não era mais concreto, e as pessoas já não eram tão perceptíveis. O senso de controle se esvaia enquanto suas pernas começavam a doer. Ele parou. Parou e olhou para o abismo que se estendia ao fim da avenida. Perdia o interesse pelas velhas e repetitivas conversas, pela mesmice da rotina que impregnou. Não queria voltar pra casa, ou para qualquer lugar. Não sabia mais o que queria, não tinha mais certeza de nada na verdade. Tudo parecia tão afastado e o sentido do resto estava acabando. Precisava sentir algo real, e a adrenalina da fuga já não era suficiente. Não era sua intenção essa sensação de perda, solidão e irritação; porém era inevitável... ele queria era se despedir de tudo, estava com vontade de algo que não sabia ao certo se existia. Porém, ao perceber, pelo fim da mesma triste avenida, a ponta do que se extendia o infinito escuro mar, viu que sempre haveria uma saída. Só o restava achá-la.