um milhão de ruas sem saída

Uma praia vazia, no mínimo - silenciosa, ecoando por sua extensão apenas pelo som do mar vindo ao encontro da areia.
Intenso frio, frio cortante, frio envolvente.
Uma pessoa apenas, entrando em termos com seu atualmente desolador espírito solitários, nos aspectos de concordância e conformismo.
O privilégio do mar de ser a única fonte de som seria quebrado por alguma música; o ócio dominante quebrado por alguns cigarros e uma garrafa de vinho - pra mais.
Não ter que lidar, ligar, responder; pensar em respostas para perguntas de outros. Encarar as suas perguntas, naquele momento ambíguas indagações nada bem formuladas o bastante para renderem respostas, ou melhor, possibilidades de respostas concretas.
Respirar, fundo o bastante para chorar todas as lágrimas há tanto guardadas, reprimidas. Deixando tudo sair, naquele que seria um ideal momento de solidão. De uma forma ou de outra, todos andam sendo da mais profunda solidão, mas não restava muita escapatória porque as pessoas teimavam em ir e vir ao seu redor, trazendo complicações não bem vindas. Naquele momento, porém, não haveria mais ninguém, não estaria em questão a convivência, a obrigação do dia-a-dia de dizer algo direcionado aos outros. O perfeito escape.
Esvaziar a mente de qualquer drama idiota e não pensar em que o amanhã aguardaria mais obrigações em um período de tempo longo demais; tempo que anda passando absurdamente rápido porém embarcado em um absoluto vazio. Era como se os dias caminhassem apressadamente em uma rotina que os deixavam sentados em si mesmos, parados, imóveis. Apressavam-se, porém pareciam tanto entre si que deixavam uma sensação de que ainda não haviam passado. Esvaziar-se dessa idéia para que eles mudassem, quem sabe. Mas ao mesmo tempo havia o intuito de tirar qualquer expectativa - elas revelavam-se tolas e, de qualquer forma, cada vez mais escassas.
Em suma, um refúgio seguro para depósito de pensamentos, especialmente depósito daquele estado que trazia uma mistura quase assassina de sentimentos de ódio, de tristeza, de cansaço, sentimentos que remetiam um nada; intercalando-se com agonia e nervosismo ímpares - quem sabe por ansiedade de qualquer outra coisa porém aquilo. Mistura que agia como um tipo de areia movediça, afundando, aprofundando-se. E que sentimento idiota, sem razão específica, que bateu e está custando a sair. Quem sabe ele não está tristemente predizendo o que será o resto daquela estação, ou de algum período indeterminado de tempo. Porque a crença de que algo bom está chegando anda esparsa e fina demais para ser mesmo considerada uma crença, já que há pouca (possivelmente nenhuma) fé envolvida. Ridículo, ele, aquilo, a situação, o que se tornara.

Citação: David Bowie - Changes

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