Céu aberto, em uma manhã morna. Uma caminhada, condizente com esse tempo agradável. Ao descer sua rua, ouvindo qualquer música otimista, observou os outros moradores dentro de suas habituais rotinas. Observou a velha senhora que sempre estava ou fumando ou acendendo o cigarro, com seu velho carrinho de compras, trazendo algumas frutas da feira. Viu o homem do frete que já fora publicamente acusado de pedofilia. Viu sua vizinha tentando espiar a casa ao lado, viu os cachorros latindo para o bêbado que fora grande amigo de seu avô alcoólatra. Uma mulher próxima da meia-idade o ultrapassa, com alguma pressa. Sua expressão é de cansaço. Um barulho de ônibus ecoa e ele consegue ouvir qualquer resmungo de raiva que saíra da boca da tal mulher - o som de seu aparelho de música estava relativamente baixo. Em seguida, crianças passam rindo e dividindo uma bala, ele diminui o passo e as observa atentamente, relacionando com algo que ele também viveu e que há tempo passou - para ele e sua juventude, ao menos, parecia muito tempo, mesmo nem sendo tanto assim. Havia algo de mágico em ver crianças rindo e brincando, sendo crianças, sem qualquer malícia ou dúvidas em seus olhos. Outras duas senhoras idosas, discutindo com fervor sobre o novo padre da paróquia, se ele era ou não homossexual - ao menos parecia, segundo a falsa loira da esquerda. A da direita se contentava com olhares sarcásticos. Carros transitavam, a maioria em baixa velocidade - dado o caráter extremamente residencial do lugar -, mas alguns teimavam em fincar seu espírito suburbano com roncos irritantes de motos e carros populares. A mulher com expressão cansada que antes estava próxima à ele agora se encontrava quase na esquina da rua, dando passos largos e decididos - provavelmente decididos a não se deixar atrasar no trabalho. Ainda se ouvia as risadas das crianças, uniformizadas e agora brincando com um cachorro. Alguns adolescentes passaram, em passos irregulares, falando alto e mascando chicletes - a idade desses deveria ser aproximada a dele, e talvez ele até conhecesse de vista, mas não era exatamente integrado socialmente ao lugar onde vivia.
É o incrível de observar, sabe. Tantas pessoas, tantos modos de vida, tantas situações, tantos pensamentos flutuando por aí. Ele estava se perdendo imaginando o que todas aquelas pessoas estavam pensando, como havia sido a noite delas, qual eram suas aflições e conquistas pessoais. É tanta riqueza de detalhes, tanta variedade, é só dar uma rápida olhada, é só parar um pouco e olhar, parece tão fácil, não? E o é, mesmo. Mas poucos o fazem, por algum motivo que soa desconhecido.
Ele caminhou mais um pouco, até um ponto mais alto onde era possível ter uma boa vista da baía. O som já estava consideravelmente mais alto. Tirou seu pequeno caderno de anotações aleatórias e escreveu qualquer coisa que estava sentindo, e começou a concluir um excelente dia que teve ao lado de si próprio... e de todo o resto.
Citação: Supertramp - Dreamer
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